A 55 anos da Basílica efêmera, o embrião da Casita do Tepeyac

A 55 anos da Basílica efêmera, o embrião da Casita do Tepeyac

12 de outubro de 1970, a Basílica de Guadalupe registra um marco em sua história que, atualmente, poucos lembram. Esse dia, o arcebispado do México teve uma magna celebração em honra à Mãe do céu. Esse momento era o 75º aniversário da coroação pontifícia da imagem por vontade do Papa León XIII.

Nas crônicas daquele distante 1895 –o do 130º aniversário neste 12 de outubro- se registram esplendorosos e magnos eventos religiosos congregando a sacros e profanos. Foram os arcebispos do México, Próspero María Alarcón e de Michoacán, José Ignacio Árciga Ruiz de Chávez que, representando a Igreja do México, impuseram a coroa à imagem da Virgem de Guadalupe ante fiéis e 36 bispos que ouviram o juramento de fidelidade do recém-nomeado abade, José Antonio Plancarte y Labastida, perpetuando-se na memória do México católico e guadalupano.

  1. Vila de Guadalupe

 Em 1970, deveria ser lembrado com igual solenidade e algazarra. E é especial porque se trata de uma das poucas ocasiões em que a Virgem de Guadalupe deixou seu altar para estar perto do povo católico, seis anos antes de seu traslado à moderna Basílica.

Basílica Antiga foi testemunha muda do respeito, amor e devoção de milhares de pessoas quando esse fato inédito se perpetuou na memória: Ver de perto a imagem da Guadalupana. No início daquela década, o edifício da chamada Colegiata sucumbia ao passo do tempo e praticamente era insuficiente para receber milhares de peregrinos.

Durante o arcebispado do cardeal Miguel Darío Miranda e do abade Guillermo Schulenburg Prado, nomeado por Juan XXIII em maio de 1963, o 75º aniversário da coroação deveria ser de tal impacto e magnitude como aquela de 1895.

 

Cardeal Miranda e Abade Schulenburg. Magna eucaristia.

 

Segundo as memórias do abade Schulenburg publicadas em 2003 pela casa editorial Miguel Ángel Porrúa, os 12 primeiros dias de outubro de 1970 foram organizadas celebrações litúrgicas em um espaço que foi o embrião do atual imóvel onde hoje está a bendita imagem. Chamou-se Basílica efêmera, assim o recordava o último abade de Guadalupe:

O marco digno para as celebrações litúrgicas e paralitúrgicas dos 12 primeiros dias do mês de outubro de 1970 foi, sem dúvida, a chamada «Basílica Efêmera» que na realidade resolveu de forma adequada os diversos problemas de higiene, capacidade, visibilidade, participação do povo de Deus e digna celebração do Santo Sacrifício da missa.

A Basílica efêmera teve por teto uma lona rosa montada bem em frente à antiga Colegiata. Desenhada pelos arquitetos Fr. Gabriel Chávez de la Mora, Juan Planas y Héctor García Olvera foi montada pela Casa Planas e abrigaria os milhares que estariam na celebração presidida pelo cardeal Miguel Darío Miranda.

 

Basílica efêmera. Embrião do moderno recinto.

 

As fotos da época imortalizaram os momentos em que os trabalhadores utilizaram guindastes e maquinaria para montar o teto onde estaria o altar que receberia a guadalupana flanqueada por uma grande cruz. Justamente na noite de 11 de outubro de 1970, Santa Maria de Guadalupe deixou o resguardo do antigo edifício para dar dignidade à Basílica efêmera que estava pronta para a grande celebração eucarística dos 75 anos da coroação de León XIII.

Um dos poucos testemunhas desse extraordinário fato foi o licenciado Fernando Chiquini Barrios. Educado desde o nível de estudos de primária e até o preparatório pelos padres beneditinos do Colégio Tepeyac na colônia Lindavista.

Chiquini teve um ativo apostolado no convento das Madres Auxiliadoras operando o dispensário para os mais necessitados de 1964 a 1970. Graças a essas atividades conheceu ao padre José Cenobio Ramírez que colaborou com o abade Schulenburg na Colegiata.

Em 2020, Chiquini compartilhou com este blog suas lembranças de esse especial momento de ter a apenas um metro a preciosa imagem do povo mexicano. Esse outubro de 1970 ficou na memória de quem, nesse mesmo ano, se formou como licenciado em administração pela UNAM.

 

Chiquini Barrios. Testemunha

Que lembranças guarda dessa Basílica efêmera, como foi sua instalação?

-Sobre a construção da Basílica efêmera tive conhecimento desde seu planejamento já que o abade Guillermo Schulenburg convidou a fray Gabriel Chávez de la Mora para que o apoiasse no design e construção do projeto.  Eu conhecia Chávez de la Mora desde vários anos antes já que era frade Beneditino.  Fazia finais do mês de setembro havia muito entusiasmo para essa celebração e muita atividade para a finalização da Basílica efêmera que foi ao mesmo tempo um design preliminar da Nova Basílica.

Na verdade, você foi um dos poucos a ter a honra de ver de perto a imagem da Virgem de Guadalupe e atestar o traslado ao altar da Basílica efêmera, como foi esse momento?

-O padre Cenobio me convidou para que assistisse ao traslado da Virgem na noite anterior, isto é, 11 de outubro. Devido às medidas de segurança implementadas ingressei às 11 da noite pela parte posterior através do escritório do ecônomo. Os trabalhos para baixar a Virgem se iniciaram à 1 da manhã, eu lembro que havia entre 80 e 100 convidados. Uma vez embaixo a posicionaram com muito cuidado no chão sobre uma base onde se sustentava verticalmente. Nos convidaram a passar para vê-la de perto, a um metro de distância, em pares. Meu par foi o padre beneditino Hildebrando Garza, meu mestre no Tepeyac.  Enquanto fazíamos fila se respirava um ambiente tenso e plenamente em silêncio. Quando nos tocou estar frente a Ela foi uma bela e grande emoção que ao ponto das lágrimas. O padre Hildebrando me explicava em detalhe o ayate. Foram 5 minutos, para mim uma eternidade. Às 5 da manhã se colocou o ayate na Basílica efêmera.

 

Madrugada de 12 de outubro, 1970

Este 12 de outubro se cumprem 50 anos da Basílica efêmera, meio século desde que a Virgem de Guadalupe desceu de seu altar para estar perto de seus filhos, que sentimento guarda após o passo desse tempo?

-Efetivamente, passaram 50 anos e sempre levo comigo essa lembrança. Quando o contei à minha família também se emocionaram muito e me comentaram que era obra da minha mãe que havia falecido 4 anos antes. Desde há muitos anos trago comigo uma medalha com a imagem da Guadalupana. Só posso dizer que me sinto um homem abençoado, fielmente crente. É por isso que, periodicamente, assisto à missa no mosteiro Beneditino de Ahuatepec, Morelos, também foi desenhado e construído por fray Gabriel Chávez de la Mora.

1970. Festa pelos 75 anos da coroação

 

Essa Basílica efêmera foi o germe da nova Basílica construída sob não poucas tensões, aproximações, negociações e convenios com o poder. Uma nova casa que, como recorda o abade Schulenburg, era necessidade vital para a gente do nosso país.

Essa segunda-feira 12 de outubro de 1970, Paulo VI dirigiu uma emotiva radiomensagem ao povo do México. Palavras que parecem se atualizar quando, nestes tempos particularmente difíceis, Santa Maria de Guadalupe acompanha a seus filhos. Nessa ocasião essas palavras chegaram em uma radiomensagem e ainda parecem ir para nossos problemas mais agobiantes e urgentes: Amadíssimos mexicanos, queremos hoje fazer eco ante vós de tantas tristezas e ansias que agobiam o mundo, as quais não nos podem deixar indiferentes se queremos de verdade ser fiéis à mensagem evangélica. Um cristão não pode se sentir tranquilo enquanto houver um homem que sofre, que é tratado injustamente, que não tem o necessário para viver. Um cristão não pode menos de demonstrar sua solidariedade e dar o melhor de si mesmo, para solucionar a situação daqueles a quem ainda não chegou o pão da cultura ou a oportunidade de um trabalho honrado e justamente remunerado; não pode ficar insensível enquanto as novas gerações não encontrem o canal para fazer realidade suas legítimas aspirações, e enquanto uma parte da humanidade siga estando marginalizada às vantagens da civilização e do progresso.

Para Paulo VI a melhor coroa que a Virgem de Guadalupe podia portar era a de a fidelidade ao Evangelho da qual Ela soube ser o exemplo eminente. A 55 anos da Basílica efêmera, talvez seja necessário abrir os ouvidos às proféticas palavras do Papa santo.

 

 

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