TRIBUNA: Quando a Fé vacila diante do abuso de um menor

Por: Javier Trigo

TRIBUNA: Quando a Fé vacila diante do abuso de um menor

Toda vez que tenho conhecimento de um abuso sexual cometido contra uma criança ou uma menina, sinto que algo dentro de mim se racha. Penso em como alguém danificou o mais sagrado de uma pessoa indefesa, quebrou sua dignidade e colocou em grave risco o desenvolvimento de uma personalidade ainda incipiente.

Mas quando esse abuso é cometido por uma pessoa consagrada —um religioso, um sacerdote, um pastor de almas— essa sensação vai muito além: abala minhas próprias estruturas, minhas convicções mais profundas como crente.

Penso, ante todo, na alma dessa criança ou dessa menina que talvez se aproximava de Deus buscando amor, consolo ou sentido, e que em seu lugar se deparou com o rosto do mal. Em lugar do amor de Deus, o espírito do diabo. Penso também em seus pais e me coloco em seu lugar: o que eu sentiria se algo assim acontecesse a um de meus filhos? É uma pergunta que não tem resposta possível sem que o coração se parta.

E me dirijo a Deus perguntando-lhe por que permite que isso ocorra dentro de uma instituição cuja missão é precisamente aproximar as almas Dele. Não da rebeldia, mas do desconcertamento e da dor.

Penso também no agressor, e vêm à minha memória aquelas duras palavras de Jesus no Evangelho: «A quem escandalizar a um destes pequenos, mais lhe valeria que lhe atassem ao pescoço uma pedra de moinho e o lançassem ao mar». E ainda assim, desde minha fé, peço ao Senhor que lhe conceda a graça do arrependimento verdadeiro: que seja capaz de reconhecer o horror cometido, de pedir perdão e de tentar, na medida do possível, restituir o dano causado.

Não posso deixar de pensar tampouco naqueles que, tendo conhecimento desses fatos, os ocultaram ou não fizeram nada para preveni-los ou corrigi-los, crendo que era melhor encobri-los para evitar o escândalo. Também por eles rezo, para que sejam conscientes de sua responsabilidade no dano infligido a essas almas ingênuas e boas, às quais agora espera um futuro marcado por feridas profundas e difíceis de curar.

E finalmente me pergunto se eu sou melhor que eles. O que posso fazer eu para ajudar, para colaborar em limpar essas manchas que se produzem dentro da Igreja de Cristo. Recordo então umas palavras de São Josemaría Escrivá que durante anos me custou aceitar: «Todos somos capazes de cometer os maiores erros e os maiores horrores». E é verdade. Ninguém pode se sentir a salvo se não luta, se não se esforça cada dia por viver de acordo com seus princípios. Por isso rezo também por mim e pelos meus, para que o Senhor nos mantenha fiéis à sua palavra.

Mas não basta a oração. A oração é imprescindível, sim, mas deve ir acompanhada de decisões firmes e valentes. As organizações religiosas têm a obrigação moral e humana de adotar todas as medidas necessárias para evitar que esses horrores aconteçam. E se, por desgraça, voltarem a se produzir, devem atuar com rapidez, transparência e justiça: dedicar-se ao cuidado e acompanhamento das vítimas e de suas famílias, pôr todos os meios para tentar curar uma ferida tão profunda, e afastar definitivamente do serviço àqueles que demonstraram ser um perigo para os demais.

Calar, minimizar ou olhar para outro lado nunca pode ser uma opção. A dignidade de uma só criança o exige tudo.

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